Eles já levaram você e seus amigos ao cinema ou os prenderam ao sofá, à espera do novo episódio de uma série de TV. Fabiano, de 39 anos, e Caio, de 37, são irmãos, estudaram cinema na mesma faculdade, a Faap, trabalham juntos e fazem sucesso por isso. Eles são sócios da Gullane Entretenimento, produtora de cinema e televisão responsável por levar às telas alguns dos maiores lançamentos do cinema nacional da última década, como Bicho de Sete Cabeças, Carandiru, O Ano em que meus Pais Saíram de Férias, Chega de Saudade e As Melhores Coisas do Mundo. Para a TV, produziram a série Carandiru – Outras Histórias, exibida pela Rede Globo, em 2005, e Alice, de 2008, a produção brasileira de maior orçamento (R$ 1 milhão por episódio) já realizada para o canal pago HBO – e que retorna à programação no próximo mês de novembro, em dois telefilmes inéditos.
Por que, então, você tem a impressão de nunca tê-los visto antes? Simples: os Gullane são homens de bastidores. Seu trabalho é transformar boas ideias de cineastas como Laís Bodanzky, Hector Babenco e Cao Hamburger em filmes bem-sucedidos. Para isso, captam dinheiro, organizam a logística das gravações, coordenam as etapas finais de edição e montagem e ajudam a definir as melhores maneiras de lançar e comercializar uma fita. Faz parte do trabalho deles, por exemplo, transformar um pavilhão desativado da Penitenciária do Carandiru, na Zona Norte da capital, em set de filmagem ou transportar geradores, câmeras e equipamentos para o Jalapão para rodar as cenas de um único episódio da série de TV Alice nas dunas do deserto, a 270 quilômetros da capital do Tocantins, Palmas.
UM ORGANIZA, O OUTRO EXECUTA
Todos os processos envolvidos no desenvolvimento dos filmes e programas de TV produzidos pela Gullane são concebidos, geridos e finalizados em uma tranquila vila de casas geminadas, na Vila Clementino, na Zona Sul da cidade. Ali, 30 pessoas trabalham com Fabiano, Caio e seus dois sócios minoritários, Débora Ivanov e Gabriel Lacerda. Cabe a Fabiano apresentar os projetos a investidores, trazer o dinheiro para produzi-los e negociar a distribuição das produções – no Brasil e no exterior. Com o dinheiro no caixa, Caio entra em cena. É ele quem comanda o dia a dia da produção, decide quem estará nas equipes de filmagem e como o trabalho será distribuído. “O Fabiano sabe organizar o jogo, e o Caio sabe executá-lo muito bem”, afirma Hector Babenco, diretor de Carandiru, que entregou seu próximo filme (ainda em fase de pré-produção) aos Gullane. “Eles se complementam de uma forma muito legal.”
Débora Ivanov, na sociedade desde 2001, cuida dos contratos e do jurídico. Gabriel Lacerda, que chegou em 2008, encarrega-se do financeiro e da administração geral. A “famiglia” é completada por Manuela Mandler, mulher de Fabiano, à frente do departamento internacional; e por Paula Bleier, mulher de Caio, que também é produtora. O braço da Gullane para a televisão é tocado pelos irmãos Maurício e Fernando Dias e já responde por 40% do que produzem hoje.
Para transformar boas ideias em cinema lucrativo e de qualidade, eles adotaram um modelo de negócios calcado em três pilares que lhes dá respaldo financeiro para desenvolver até 30 projetos simultâneos. O primeiro é a diversificação das fontes de captação de recursos. O dinheiro obtido por meio de leis de incentivo é complementado pela participação de investidores privados, que bancam 20% do orçamento da produtora. O segundo é a internacionalização: os filmes ora são realizados em sistema de coprodução com outros países, ora têm sua distribuição fora do mercado brasileiro negociada com grandes empresas como Warner e Sony Pictures. O terceiro é a produção de conteúdo para TV, cujo retorno financeiro é menos arriscado que o dos projetos cinematográficos.
“Esse é o modelo adotado por produtoras independentes em todo o mundo”, diz John Hopewell, correspondente internacional da revista Variety, a publicação mais importante sobre o mercado cinematográfico mundial. “Não é algo comum no Brasil, mas os Gullane sabem fazer isso muito bem.” Fabiano conta que a proposta da Gullane é fazer filmes autorais mas que também tenham aspectos comerciais. “Uma inspiração é Pedro Almodóvar, que, com uma produtora independente, faz um cinema que concilia público a uma p. cinematografia”, afirma Caio. “Aquele papo de que é preciso escolher entre ganhar festival ou atingir público não existe. O melhor mesmo é conseguir os dois.” Eles dizem que, entre os cineastas que lhes servem de modelo, estão os norte-americanos Martin Scorsese, David Lynch e Francis Ford Coppola, além do italiano Federico Fellini (1920-1993) e do francês François Truffaut (1932-1984).
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